Interlúdios no RPG

Vocês já usaram interlúdios nos seus jogos? É uma ferramenta meio contraditória e difícil de usar, mas olha, fica bem bacana quando dá certo.

Interlúdio (segundo a internê) é uma cena ou trecho musical entre dois atos de uma peça de teatro. Eu conheço a expressão dos quadrinhos, onde às vezes era usada no lugar de “enquanto isso” ou “entrementes”.

No RPG a narrativa está sempre focada nos protagonistas. Às vezes acho legal os jogadores saberem mais sobre a história e a ambientação, ou vejam as coisas sob outro ponto de vista. É divertido, melhora o entendimento da história (dando a ‘big picture’) e até contextualiza melhor os jogadores no cenário onde eles não estão totalmente inseridos (ao contrário de seus personagens).

Um exemplo de interlúdio (bem sucedido) que um amigo meu usou: estávamos dormindo numa estalagem em uma vila portuária em Eberron. De repente o mestre narrou a cena da praia, com alguns sahuagins (aqueles diabinhos aquáticos) iniciando um ataque e um deles usando uma taça de prata para invocar um elemental da água gigantesco. A ‘cutscene’ ficou tão boa que eu roubei e usei em uma campanha minha depois. :D

É um recurso pouco usado (acho eu) porque os jogadores geralmente assumem um papel passivo na cena, o que pode ser meio brochante, especialmente se o narrador se demorar. Já sofri disso em campanhas cheias de cutscenes (outra coisa chata de se fazer). Por isso sempre tive receio de usar.

Esses dias, porém, fiz um meio sem querer no jogo solo de minha esposa Elisa. Ela estava doida pra saber o que dois NPCs tinham conversado; fui narrando pra ela a discussão dos dois – no caso, o marido da PJ e sua amante, e como eles se separaram. Aí improvisei e disse que uma amiga da personagem por acaso estava na mesma taverna e depois veio falar a ela o que ouviu, e a cena ficou como se ilustrasse a narração da NPC.

Então, essa ferramenta pode dar uma variada boa na narração, desde que não estrague as boas surpresas dos PJs. Quando não é crucial que os jogadores não saibam de algo, fica legal mostrar a eles rapidamente uma cena com o que acontece por trás das cortinas. Também pode ser uma boa introdução de cenas, como a que mencionei lá em cima. O pulo do gato é envolver os jogadores no interlúdio, com a cena respingando neles de alguma forma, como no nosso jogo solo, ou nas séries de TV onde você vê o assassinato/roubo/etc que os protagonistas vão investigar.

Dá pra envolver os jogadores mais diretamente ainda. Eles podem sugerir desdobramentos ou até tomar o controle da cena, se a narrativa for mais compartilhada. No melhor estilo Fiasco, o narrador pode configurar a cena e deixar os jogadores no controle dos NPCs (funciona melhor se eles conhecerem os NPCs e os planos deles não forem muito secretos).

Nessa toada, sempre há a “aventura paralela”, quando os jogadores criam personagens para salvar seus caras regulares (ou até pegar o corpo e ressuscitar) ou abordar outro aspecto da campanha. Há inúmeras possibilidades bacanas, com PJs paralelos dando plots para os regulares (“um grupo foi mandado mas não retornou…”), ou perseguindo coisas que os regulares não podem.

Rafão Araújo, do Reduto do Bucaneiro, fez isso com sua campanha: os jogadores criaram personagens mais militares com o propósito final de salvar os regulares (cuja campanha era em uma cidade grande e eles foram escravizados), e mudava o foco entre as duas narrativas. Pelos reportes dele, ficou muito legal.

Tem um tipo de interlúdio onde um plano é executado ao mesmo tempo que é explicado, como no Matrix Revolutions. É dificílimo de fazer e bem perigoso, porque a narrativa pode ficar tosca ou ir pelos ares, mas se feito com sucesso fica espetacular. Até porque se os jogadores ou o narrador possuírem uma carta na manga, a surpresa é maior. Eu fiz uma vez, mas o plano era de um NPC, então foi meio railroad mas foi bacana.

Enfim, como sempre digo, toda ferramenta narrativa usada no tom e do jeito certo só tem a melhorar a experiência de jogo. Me digam aí as suas!

5 comentários em “Interlúdios no RPG

  1. Nunca usei esse recurso em jogo, meio porque tenho medo de deixar escapar um mistério essencial para o andamento do jogo.

    Agora vou começar uma aventura de apresentação de rastro de cthulhu para meus amigos e vou tentar usar este recurso narrativo, deixando eles usarem personagens secundários na estória.

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  2. Eu adorei esse recurso é muito divertido e ficou extremamente bom quando foi usado por você. Gosto muito de bastidores e adoro quando a narrativa é compartilhada.

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  3. Eu sempre digo: “Vocês não veem, mas quem ta vendo o filme vê que…” quando uma cena é altamente foda e nao tem nenhum PJ presente ou até consciente no combate.

    Instiga, diverte e sempre dá certo =D

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  4. Nas mesas onde jogo alguns narradores usam o recurso das cutscenes (ou chamadas CGs por aqui) para apresentar mistérios de alguns NPCs e ouros eventos, mas bem de leve, pra manter o mistério. Como narrarei já mês que vem, ainda pensarei em como usar esses recursos como interlúdios e cutscenes, que seja de forma equilibrada.

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